sexta-feira, dezembro 01, 2006

JORNADA DE UM FOTÓGRAFO


Jornada de um fotógrafo
por Rober Machado

Antes das guerras serem transmitidas ao vivo pela televisão, as principais imagens que tínhamos dos conflitos vinham dos jornalistas de guerra, sujeitos que passavam meses no front registrando os combates. Também eram publicadas extensas reportagens fotográficas sobre a guerra, o nome de Robert Capa é sempre citado como melhor exemplo dessa área. Nos últimos tempos, esse conceito de reportagem fotográfica perdeu terreno para as imagens em movimento, devido a seu imediatismo. Mesmo assim, continuam existindo os correspondentes de guerra registrando tudo com suas lentes.
Quando se fala em jornalismo em quadrinhos, praticamente só é citado Joe Sacco. Famoso por visitar regiões conflituosas, como Palestina, Bósnia e Iraque, produz quadrinhos de primeira qualidade com o material que vê e dos depoimentos que recolhe.
Agora esse time ganhou um significativo acréscimo com a publicação de O Fotógrafo, uma interessante combinação de quadrinhos e fotos.
Em 1986, o fotógrafo Didier Lefèvre saiu de Paris com o objetivo de acompanhar uma caravana da ONG Médicos Sem Fronteiras pelo interior do Afeganistão. Na época, o país havia sido invadido pela União Soviética e estava fragmentado numa guerra civil. A caravana saiu do Paquistão acompanhada dos “mujahidin”, os guerrilheiros afegãos que lutavam contra a invasão soviética e que levavam armamento e munição para seus companheiros. Dois objetivos distintos, mas era a única forma de entrar no país.
Lefèvre voltou com centenas de fotos, que até ganharam exposições em museus, mas ao invés de publicá-las em livro como uma reportagem fotográfica, resolveu partir para um projeto diferente. O Fotógrafo, conta a história da viagem ao Afeganistão através de suas fotos e dos desenhos de Emmanuel Guibert, também responsável pelo texto. As fotos são em preto e branco, mas os desenhos foram coloridos por Frédéric Lemercier, que também diagramou a história.
A história é narrada em primeira pessoa por Lefévre, que vai contando suas impressões e sensações a respeito desse país desconhecido. Seu foco são as pessoas do povo, não tece opiniões sobre a situação política do momento. Aos poucos, vai notando as diferentes etnias que encontra e as diferenças culturais entre elas, o que tira impressão que o afegão é um povo só. Também há as diferenças entre a cultura ocidental e a deles. Por exemplo, os afegãos não entendiam como uma mulher poderia liderar a equipe de médicos, mas aceitaram o fato.
A leitura fluiu agradavelmente entre fotos e desenhos, a narrativa não é prejudicada, pelo contrário, um auxilia o outro. Não há nenhuma intervenção gráfica nas fotos, como colocar balões. Quando necessário, existe texto para contar algo relativo a foto.
Um trabalho inovador que deve atrair tanto leitores tradicionais de quadrinhos quanto curiosos pela proposta diferenciada. Ninguém irá se decepcionar. Só tem um único porém: a história não termina nesse primeiro volume. Ao ler “Continua” na última página, fica-se com a vontade imediata de conhecer o restante da jornada do fotógrafo. Esse primeiro volume foi publicado na França em 2003, o terceiro e mais recente neste ano. Fica a torcida para que a editora Conrad não demore em trazer o restante e que continue publicando com a mesma qualidade que fez essa bela edição.

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