+ Mulheres e HQ's-por Lielson Zeni

Semana passada falei de mulheres nos quadrinhos – ouvi dizer que esse mês será delas por aqui.

Agora, em vez de elencar mulheres que estão dentro das páginas, vou falar das mulheres que constroem essas páginas. Se bem que as duas moças de hoje estão nas páginas que elas mesmas criam.

Marjane Satrapi e Alison Bechdel contam suas memórias em duas das obras mais significativas dos quadrinhos da primeira década do Século XXI, respectivamente Persépolis e Fun Home – Uma tragicomédia em família.

Persépolis foi lançado em edição nacional pela Cia. das Letras, em 4 álbuns e um ‘tijolinho’ completo. Satrapi conta sua infância em meio a troca de regimes de governo, sua adolescência vivida nas proibições do regime ultrafundamentalista, sua mudança para a Europa, a fim de estudar Belas Artes.

É muito interessante como os aspectos culturais e as tradições do Irã e sua história política, que parecem tão exóticos aos nossos olhos ocidentais, retratem condições tão essencialmente humanas e universais.

Não é preciso ser um iraniano pra saber o que é toque de recolher e repressão institucionalizada.

No Brasil isso tudo é história recente, seja em governos militares, seja em batalhas entre milícias e traficantes. Também não é preciso ser uma mulher iraniana pra sentir o peso e a pressão de “ser mulher” em uma sociedade machista. No Irã mais evidente que cá, claro. Satrapi trabalha com excelência na narrativa e texto, tudo emoldurado em um traço simples.

Alison Bechdel venceu o prestigiado prêmio Eisner com o fantástico álbum Fun Home. Bechdel conta a história da sua infância e principalmente o relacionamento com o pai. O crescimento e desenvolvimento da personalidade de Bechdel e a descoberta de sua homossexualidade, se relaciona com vários títulos da literatura, principalmente com o livro Ulisses, de James Joyce em seu trecho final.

E essas citações não são mera busca de escorar a HQ em uma arte conceituada como a literatura.

O texto literário e a narrativa visual entram em uma relação direta e suave, harmônica e perfeita,

tão diferente da relação entre Alison e seu pai, que não é ódio, desprezo ou desacordo, mas um pequeno descompasso.

Fun Home foi publicado no Brasil pela Conrad, em uma edição correta.

Duas grandes provas das possibilidades artísticas das histórias em quadrinhos, feitas por duas das melhores artistas dos quadrinhos.

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