As lutas de Martha Washington
Rober Machado
Depois de produzir algumas obras-primas como Cavaleiro das Trevas, Elektra Assassina, Batman: Ano Um e uma excelente fase com o Demolidor, Frank Miller abandonou as grandes editoras de super-heróis e passou a desenvolver projetos mais pessoais. Antes de iniciar de Sin City, Miller publicou duas obras pela editora Dark Horse: Hard Boiled e Give Me Liberty. Em ambas, apenas cuidou do roteiro e deixou os desenhos para outros artistas.
Publicada no formato de minissérie em 4 edições em 1990, Give Me Liberty, com desenhos de Dave Gibbons, mundialmente famoso por seu trabalho em Watchmen, apresentava um novo personagem: Martha Washington. O mesmo nome da primeira dama do primeiro presidente americano.
A história acontece num futuro distópico que teria início em 1996 com a eleição do um presidente que aos poucos se torna um ditador. Altera a Constituição e permite sua reeleição diversas vezes. Também promove diversas guerras, suprime direitos civis e aumenta a segregação social e racial. Frank Miller deixa claro seu posicionamento político e faz questão de enfatizar que o presidente é do Partido Republicano.
Martha Washington nasceu um ano antes da eleição do presidente e vivia num local em Chicago que foi isolado do restante da cidade, uma espécie de prisão onde só havia negros. Ainda criança, após matar um criminoso local para se defender, é levada para um instituto psiquiátrico e fica por alguns anos no local. Depois disso, Martha alista-se na PAX, o novo exército americano, que aceita recrutas de qualquer idade.
Quando a Casa Branca sofre um atentado terrorista e o presidente fica em coma, assume o cargo um democrata. Tudo parece melhorar. O novo presidente quer defender a floresta amazônica e envia tropas que irão guerrear contra as grandes empresas de alimentos. Martha é enviada para a floresta.
Tudo isso é apenas um resumo de parte da primeira edição, nas seguintes esse cenário vai sofrendo alterações. Frank Miller não é ingênuo e mostra que nem tudo são flores no sonho democrata, bastam algumas decisões erradas e tudo vai degringolando. Soma-se a isso o alcoolismo do novo presidente.
Tem que se levar em conta que a intenção de Miller é a sátira política, o que se nota através de nomes, situações e até de uma organização nazista gay. O objetivo é ressaltar o ridículo de determinados grupos e instituições.
Mesmo que tenha recebido alguns prêmios e merecidos elogios, Give Me Liberty não está no mesmo nível que outras obras de Frank Miller citadas no início desse texto. Isso não é demérito nenhum, não significa que seja ruim, ainda é uma grande história em quadrinhos.
Miller até repete algumas fórmulas de Cavaleiro das Trevas, como o uso da televisão para informar acontecimentos para o leitor. Também utiliza matérias de revistas semanais para o mesmo fim.
O desenhista Dave Gibbons também foi um dos fatores do sucesso desta série, seu traço clássico conduz muito bem a narrativa visual. O único porém está em poucas cenas de luta, que parecem um tanto estáticas, sem movimentos.
No Brasil, essa história foi publicada duas vezes. Na primeira pela editora Globo em 1991, no formato de minissérie, teve o título de Liberdade – Um Sonho Americano. Apesar de “um sonho americano” ser o subtítulo da obra original, o título simples não refletia a força da frase de Patrick Henry que serviu de inspiração: “dê-me a liberdade ou dê-me a morte”. Recentemente, a editora Mythos reeditou a história num volume encadernado com o título de Liberdade a Qualquer Custo. A nova tradução foi mais cuidadosa, forneceu um título mais adequado e foi mais fiel nos títulos dos capítulos, além de verter alguns nomes para o português, o que era necessário para entender a intenção dos mesmos. Na edição da Mythos, além da diferença de papel, o tom das cores é mais escuro do que a publicação anterior.
No ano passado, a Mythos editou num único volume Martha Washington Vai à Guerra, a segunda minissérie da heroína. Publicada originalmente em 1994, como o próprio Frank Miller define no posfácio, é um “rito de passagem” para a personagem. O foco sai um pouco das questões políticas e cai mais na ação, como o título sugere.
Com os EUA afundando numa grande crise, vários estados lutam por sua independência numa nova guerra de secessão. Martha ouve sobre a existência de “fantasmas” que atrapalhariam planos de ambos lados. Ao investigar a existência desses seres, descobre algumas verdades sobre o governo, revoltando-a a ponto de abandonar seu cargo militar e virar uma “traidora”.
Um pouco inferior ao trabalho original, principalmente por ser mais focado na ação, Frank Miller ainda utiliza recursos comuns dos quadrinhos de super-heróis, como a volta de personagens que se julgavam mortos.
O desenho de Dave Gibbons também apresenta diferenças, suas cenas de ação estão melhores do que na primeira série. O próprio traço está mais grosso e com um nível de detalhamento diferente. Uma mudança significativa foi a utilização de cenários criados digitalmente em alguns quadros. Parecia que Gibbons ainda experimentava essa técnica porque em alguns momentos esse desenho digital está bem integrado com o desenho tradicional enquanto em outros parece um efeito primário. Exemplos disso estão nas páginas 84 e 85, com um bom fundo, enquanto na página 134 há uma montanha muito tosca.
O restante das histórias de Martha Washington ainda é inédita no Brasil. Há duas edições isoladas publicadas em 1995, Happy Birthday Martha Washington e Martha Washington Stranded in Space, uma minissérie de 1997, Martha Washington Saves the World, e uma última edição que deve ser publicada em julho próximo: Martha Washington Dies. Estranho o fato de Frank Miller dar fim a sua personagem numa edição de apenas 24 páginas.
Como agora Miller está se dedicando mais ao cinema do que aos quadrinhos, já expressou seu desejo de levar as aventuras de Martha para as telas, mas ainda não sabe como fazê-lo, já que resultaria em muitas horas de filme. Além disso, teria que arranjar a atriz ideal, alguém bem jovem. Ao final da primeira série, Martha tem apenas 17 anos, na segunda história tem 19 e é mais velha nas seguintes. Na última edição, a trama ocorre no seu centésimo aniversário.
É uma personagem que mereceria uma boa adaptação cinematográfica. Afinal, quantas heroínas negras já apareceram no cinema, ainda mais com uma trama de forte fundo político?
Rober Machado
Depois de produzir algumas obras-primas como Cavaleiro das Trevas, Elektra Assassina, Batman: Ano Um e uma excelente fase com o Demolidor, Frank Miller abandonou as grandes editoras de super-heróis e passou a desenvolver projetos mais pessoais. Antes de iniciar de Sin City, Miller publicou duas obras pela editora Dark Horse: Hard Boiled e Give Me Liberty. Em ambas, apenas cuidou do roteiro e deixou os desenhos para outros artistas.
Publicada no formato de minissérie em 4 edições em 1990, Give Me Liberty, com desenhos de Dave Gibbons, mundialmente famoso por seu trabalho em Watchmen, apresentava um novo personagem: Martha Washington. O mesmo nome da primeira dama do primeiro presidente americano.
A história acontece num futuro distópico que teria início em 1996 com a eleição do um presidente que aos poucos se torna um ditador. Altera a Constituição e permite sua reeleição diversas vezes. Também promove diversas guerras, suprime direitos civis e aumenta a segregação social e racial. Frank Miller deixa claro seu posicionamento político e faz questão de enfatizar que o presidente é do Partido Republicano.
Martha Washington nasceu um ano antes da eleição do presidente e vivia num local em Chicago que foi isolado do restante da cidade, uma espécie de prisão onde só havia negros. Ainda criança, após matar um criminoso local para se defender, é levada para um instituto psiquiátrico e fica por alguns anos no local. Depois disso, Martha alista-se na PAX, o novo exército americano, que aceita recrutas de qualquer idade.
Quando a Casa Branca sofre um atentado terrorista e o presidente fica em coma, assume o cargo um democrata. Tudo parece melhorar. O novo presidente quer defender a floresta amazônica e envia tropas que irão guerrear contra as grandes empresas de alimentos. Martha é enviada para a floresta.
Tudo isso é apenas um resumo de parte da primeira edição, nas seguintes esse cenário vai sofrendo alterações. Frank Miller não é ingênuo e mostra que nem tudo são flores no sonho democrata, bastam algumas decisões erradas e tudo vai degringolando. Soma-se a isso o alcoolismo do novo presidente.
Tem que se levar em conta que a intenção de Miller é a sátira política, o que se nota através de nomes, situações e até de uma organização nazista gay. O objetivo é ressaltar o ridículo de determinados grupos e instituições.
Mesmo que tenha recebido alguns prêmios e merecidos elogios, Give Me Liberty não está no mesmo nível que outras obras de Frank Miller citadas no início desse texto. Isso não é demérito nenhum, não significa que seja ruim, ainda é uma grande história em quadrinhos.
Miller até repete algumas fórmulas de Cavaleiro das Trevas, como o uso da televisão para informar acontecimentos para o leitor. Também utiliza matérias de revistas semanais para o mesmo fim.
O desenhista Dave Gibbons também foi um dos fatores do sucesso desta série, seu traço clássico conduz muito bem a narrativa visual. O único porém está em poucas cenas de luta, que parecem um tanto estáticas, sem movimentos.
No Brasil, essa história foi publicada duas vezes. Na primeira pela editora Globo em 1991, no formato de minissérie, teve o título de Liberdade – Um Sonho Americano. Apesar de “um sonho americano” ser o subtítulo da obra original, o título simples não refletia a força da frase de Patrick Henry que serviu de inspiração: “dê-me a liberdade ou dê-me a morte”. Recentemente, a editora Mythos reeditou a história num volume encadernado com o título de Liberdade a Qualquer Custo. A nova tradução foi mais cuidadosa, forneceu um título mais adequado e foi mais fiel nos títulos dos capítulos, além de verter alguns nomes para o português, o que era necessário para entender a intenção dos mesmos. Na edição da Mythos, além da diferença de papel, o tom das cores é mais escuro do que a publicação anterior.
No ano passado, a Mythos editou num único volume Martha Washington Vai à Guerra, a segunda minissérie da heroína. Publicada originalmente em 1994, como o próprio Frank Miller define no posfácio, é um “rito de passagem” para a personagem. O foco sai um pouco das questões políticas e cai mais na ação, como o título sugere.
Com os EUA afundando numa grande crise, vários estados lutam por sua independência numa nova guerra de secessão. Martha ouve sobre a existência de “fantasmas” que atrapalhariam planos de ambos lados. Ao investigar a existência desses seres, descobre algumas verdades sobre o governo, revoltando-a a ponto de abandonar seu cargo militar e virar uma “traidora”.
Um pouco inferior ao trabalho original, principalmente por ser mais focado na ação, Frank Miller ainda utiliza recursos comuns dos quadrinhos de super-heróis, como a volta de personagens que se julgavam mortos.
O desenho de Dave Gibbons também apresenta diferenças, suas cenas de ação estão melhores do que na primeira série. O próprio traço está mais grosso e com um nível de detalhamento diferente. Uma mudança significativa foi a utilização de cenários criados digitalmente em alguns quadros. Parecia que Gibbons ainda experimentava essa técnica porque em alguns momentos esse desenho digital está bem integrado com o desenho tradicional enquanto em outros parece um efeito primário. Exemplos disso estão nas páginas 84 e 85, com um bom fundo, enquanto na página 134 há uma montanha muito tosca.
O restante das histórias de Martha Washington ainda é inédita no Brasil. Há duas edições isoladas publicadas em 1995, Happy Birthday Martha Washington e Martha Washington Stranded in Space, uma minissérie de 1997, Martha Washington Saves the World, e uma última edição que deve ser publicada em julho próximo: Martha Washington Dies. Estranho o fato de Frank Miller dar fim a sua personagem numa edição de apenas 24 páginas.
Como agora Miller está se dedicando mais ao cinema do que aos quadrinhos, já expressou seu desejo de levar as aventuras de Martha para as telas, mas ainda não sabe como fazê-lo, já que resultaria em muitas horas de filme. Além disso, teria que arranjar a atriz ideal, alguém bem jovem. Ao final da primeira série, Martha tem apenas 17 anos, na segunda história tem 19 e é mais velha nas seguintes. Na última edição, a trama ocorre no seu centésimo aniversário.
É uma personagem que mereceria uma boa adaptação cinematográfica. Afinal, quantas heroínas negras já apareceram no cinema, ainda mais com uma trama de forte fundo político?
Um comentário:
Uma obra que é para mim a melhor de Frank Miller.
Se se reparar bem, vemos aí a semente de um futuro não impossível.
Coloque-se em lugar das cias. de alimento as indústrias farmacêuticas.
Pense-se na questão do ouro no solo da Amazônia. E no medo de que a exploração pelo Brasil baixe os preços deste mineral.
A reserva dos Ianomani insuflada por estrangeiros pra que eles lutem por sua independencia do resto do Brasil (por causa do ouro). Pense-se no envio cada vez maior de soldados brasileiros para a Amazônia pra salvaguardar interesses nacionais.
..Uma criaçao como a de Frank vale pelo alerta das entrelinhas.
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