sexta-feira, abril 25, 2008

JORNADA AO OESTE- por Rober Machado

Uma longa viagem dentro e através das páginas de Jornada ao Oeste

Rober Machado

Depois de O Tigre e o Dragão, outra HQ chinesa chega ao país. Jornada ao Oeste não poderia ser mais diferente de sua conterrânea. Enquanto a primeira é uma representante da mais nova safra dos quadrinhos chineses, fortemente influenciada pelo mangá, Jornada representa um outro momento histórico do país e os desenhos são totalmente diferentes.

Publicada originalmente em 1962, esta história fazia parte de um movimento do governo para aumentar o nível cultural da população e os quadrinhos eram uma forma rápida e eficiente para isso. Diversas obras literárias foram adaptadas para os quadrinhos, Jornada ao Oeste é uma delas e a mais famosa. Com a Revolução Cultural conduzida por Mao Tse-Tung em 1966, a produção de quadrinhos chineses foi abandonada, só retornando na década de 80, quando Jornada foi redescoberto e considerado uma obra de arte, como outras obras do período.

Originalmente escrita por Wu Cheng'en (1500-1582) no século 16, Jornada ao Oeste une uma história real com diversos mitos da cultura chinesa. Conta a viagem que um monge fez até a Índia em busca de textos sagrados do budismo. Mas o personagem principal da história é o companheiro de viagem do monge, Sun Wukong, um macaco antropomorfizado que possui poderes mágicos.

Também conhecido como o Rei dos Macacos, Sun Wukong é uma figura mítica bastante famosa no Oriente, tendo aparecido em diversos livros, filmes, óperas, games, peças de teatro e desenhos animados. O personagem é interpretado por Jet Li em seu mais recente filme, The Forbidden Kingdom. Os leitores ocidentais de quadrinhos talvez nunca tenham ouvido falar de Wukong, mas com certeza conhecem um personagem que foi livremente inspirado nesse mito: Son Goku, o protagonista de Dragon Ball. Entre os vários pontos em comum, ambos podem viajar montados em nuvens.

Jornada ao Oeste é frequentemente comparada com grandes obras da literatura, em especial com a Odisséia já que ambas contam uma longa história de uma viagem repleta de personagens e situações fantásticas. Há passagens semelhantes, como a Fada da Colina que equivale às sereias que Ulisses encontra em sua viagem.

A versão em quadrinhos foi produzida por diversos artistas, cada capítulo é de responsabilidade de um time diferente, mas há uma grande uniformidade no estilo dos desenhos. O formato é bastante rígido: dois quadros por página, do mesmo tamanho, sem balões e com o texto na parte de baixo de cada quadro. Os desenhos sempre mostram cenas com planos abertos, não há nenhum close, e o texto muitas vezes é redundante com o desenho. Mesmo que o estilo seja muito parecido, há sutis diferenças entre os desenhistas que podem ser percebidas se olhadas com atenção. Somente os desenhistas dos capítulos 7 e 8 fogem um pouco do padrão e mostram algumas cenas com ângulos de visão um pouco diferente, dão mais destaque ao cenário do que aos personagens e mostram o único plano médio de um personagem em toda a edição, na página 370. Mesmo assim, essa “ousadia estilística” só ocorre em alguns quadros.

Jornada ao Oeste está no tênue limite entre quadrinhos e livro ilustrado, já que a história poderia ser lida sem o auxílio dos desenhos. Só que o texto sozinho não dá conta da riqueza de detalhes presentes nos desenhos. Portanto, é realmente uma história em quadrinhos, mas com uma narrativa muito pobre.

Isso tudo pode parecer que é uma leitura enfadonha, ainda mais levando em conta que este é o primeiro de três volumes e possui 466 páginas, contudo mantém o interesse do leitor pelo desenrolar da viagem do monge e seus companheiros que vão se juntando durante a jornada, também apresentando uma mitologia muito diversificada e rica, pouco conhecida do leitor ocidental. Além do mais, é o tipo de história para se ler lentamente, aproveitando suas minúcias.

A edição da Conrad mantém o padrão de qualidade de suas publicações, com um ótimo prefácio de Rogério de Campos falando sobre os quadrinhos chineses e o contexto de produção de Jornada, além de uma introdução escrita pelo tradutor Adam Sun explicando um pouco mais da obra. No site da editora há uma bela amostra das páginas iniciais do livro, inclusive com os textos da introdução e a galeria de personagens:

http://www.lojaconrad.com.br/trecho/jornada_p1.asp

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